«Face a uma prática reiterada do ministro da Administração Interna (MAI), de constante recurso a uma narrativa que assenta num modelo de comunicação política interessante, mas populista, e sendo que essa comunicação ampara uma prática política errada, sinto-me na necessidade de opinar a esse propósito.
-Anúncios e propaganda
O MAI é bastante interventivo, sereno e convicto nas suas intervenções públicas, apresenta-se nesses termos na defesa do governo e das políticas levadas a cabo por este, lançando constantemente um conjunto de anúncios que se me configuram, um mero e errado exercício de propaganda política.
Sustento a minha opinião no seguinte;
– Nomeação do diretor nacional da PSP
A recente nomeação do diretor nacional da PSP, superintendente-chefe Barros Correia, foi algo que pretendeu anular uma imagem deixada por Magina da Silva, independentemente dos bons ou maus préstimos deste, não sendo essa a questão que aqui pretendo vincar.
Colocar o superintendente-chefe Barros Correia como diretor, teve obviamente um propósito, o qual, na minha opinião, não será, nada mais nada menos que, primeiro resolver um problema que existia e que ninguém queria ver, necessidade de afastamento de Magina da Silva, segundo, mudar o modelo dessa gestão, incidindo em alguém aparentemente mais moderado, capaz e reconhecido pelos seus pares, homem do modelo de Proximidade e com potencial para um melhor relacionamento com as estruturas sindicais e demais atores, isto na ótica do MAI.
Com isto, pensa o MAI que assim fica garantida a tranquilidade dos polícias, dos seus representantes, para assim poder prosseguir e manter as mesmas políticas.
– Serviços Sociais e Alojamento
Na área dos Serviços Sociais e os valores de investimento constantemente anunciados pelo MAI, para a aposta no alojamento, é algo que na gíria se designa por “comprar com o dinheiro dos outros”.
O MAI nesse sentido não deveria constantemente invocar a política de investimento no alojamento, via serviços sociais da PSP, como um sucesso politico ou investimento do MAI, pela simples razão, de que esse dinheiro é dos polícias, face aos descontos obrigatórios a que estão sujeitos.
Obviamente que a necessidade de melhoria nas instalações dos polícias deveria ser algo já há muito ultrapassado e deveria decorrer do funcionamento natural destes serviços, ademais, através da possibilidade de participação dos polícias, beneficiários dos serviços sociais e seus “acionistas,’ no processo de decisão, quanto às opções e prioridades, já que as verbas são suas.
Apesar das debilidades existentes nessa área do alojamento, que se arrastaram durante muitos anos e nunca secundarizando a importância do investimento no alojamento, fazer desta medida um triunfo governamental é, na minha opinião, abusivo e oportunista e como tal, retira a genuinidade politica.
– Investimentos em equipamentos e infraestruturas
O MAI reitera nos seus discursos a referência aos 607 milhões de euros nas infraestruturas e equipamentos, apesar de diariamente chegarem informações, e se constatar, uma constante falta de condições nas esquadras e demais instalações.
Lembro que a ASPP/PSP, quando confrontada com o atual plano de Infraestruturas, questionou a taxa de execução do plano anterior, por ser do seu conhecimento, a baixa execução em algumas rubricas lá constantes e de facto aquilo que constato, é que o plano de investimento anterior não tem correspondência com a realidade das esquadras, dos serviços, dos meios auto, da manutenção, dos materiais de ordem pública, veja-se a falta de tonners na esquadra de trânsito da Divisão de Segurança Aeroportuária de Lisboa, que retira uns milhares euros ao Estado por incapacidade logística, ou avarias em tantas esquadras, como por exemplo de Valadares, que apesar de instalações recentes e por ausência de manutenção, se confrontam com portas avariadas, o AC avariado há mais de dois anos. Isto tão evidente e percetível em tantas outras instalações pelo país, sendo que em alguns casos deveria ter tradução punitiva para os responsáveis.
Como tal, questiono onde está efetivamente esse dinheiro? Isto porque, nas esquadras, nas viaturas, nos meios, o discurso do MAI não tem qualquer adesão à realidade e assumo, nenhuma adesão à realidade, e acrescento, se sobre aquilo que afirmo pender qualquer dúvida, basta uma simples e informal deslocação a muitas esquadras do país, muitas das quais tenho visitado nos últimos três anos.
– Efetivo [rácio e realidade]
Já várias vezes abordou este mesmo MAI, que o efetivo policial português está muito bem colocado na grelha europeia. O MAI, ao invocar esta argumentação, está obviamente a descurar a realidade do efetivo policial, que é escasso, está envelhecido, cansado e desmotivado.
Esta é a questão e não tanto discutir a matemática de 1 por 200, 2 por 400, ou 1/2 por 600.
Era muito importante o MAI não enveredar por comparações com outras realidades europeias, que em nada assentam no modelo de gestão ou organização português, ou seja, de manter centenas largas de polícias em serviço nas polícias administrativas, centenas de polícias a realizar serviço dos tribunais, centenas de polícias envolvidos em serviços de natureza ao apoio operacional, polícias de baixa prolongada, ou ainda sem capacidade física e psicológica fruto das condições difíceis de trabalho e saída tardia.
Era sim importante que o MAI se questionasse se os polícias existentes são os suficientes para as missões, valências e compromissos assumidos. Porque se são, e se o rácio é positivo como afirma o MAI, porque razão os polícias já com requisitos e requerimento colocado, são impedidos, ano após ano, de sair para a pré aposentação?
Porque os acidentes de serviço e as baixas prolongadas são uma preocupação?
Porque as folgas e férias são constantemente suprimidas?
Porque os profissionais acumulam centenas de horas na bolsa, por impossibilidade de gozo de créditos horários, dada a escassez de efetivo (assumido por todos e referenciado nos indeferimentos)?
O MAI com a comparação que insistentemente faz relativamente ao efetivo na PSP, pretende apenas desconsiderar a insuficiência de efetivo, o seu gritante envelhecimento e ofuscar a dificuldade da Instituição em atrair jovens.
– Remunerações e suplementos
Outro dos seus anúncios de propaganda é a abordagem que o MAI faz sobre vencimentos e suplementos remuneratórios.
Tenho de esclarecer que, vencimento base é uma coisa, suplementos remuneratórios é outra coisa, independentemente da forma como estes são atribuídos e dos requisitos para os receber, ou mesmo, se estão ou não indexados ou agregados ao vencimento base.
O MAI nas suas intervenções, refere sempre o vencimento dos polícias, contemplando o suplemento por serviço e risco nas forças de segurança, sendo ainda verdade que já associou muitos outros suplementos, alguns dos quais, a maioria dos polícias nunca ouviu falar, quanto mais receber.
Ou seja, quando é interessante, o MAI coloca no discurso a componente “risco” isolada do suplemento por serviço e risco, para demonstrar o espetacular avanço (opinião do MAI) dos 31 euros para os 100 euros, quando a discussão varia, já soma os tais 100 euros do risco ao suplemento por serviço e risco, para demonstrar que os aumentos salariais aplicados têm também evolução neste suplemento, por via da percentagem, o que traduz um maior valor.
Ora, cumpre-me ainda esclarecer que, há suplementos remuneratórios na PSP que carecem de efetividade de funções, ou seja, só recebe de comando, quem comanda, só recebe de patrulha, quem patrulha. E aquando de ausência ao serviço, por razões de doença não recebe, ou seja, não é todos recebem tudo, como por vezes o MAI pretende passar.
No caso do suplemento por serviço e risco, apesar de ser de condição policial, é um suplemento e não vencimento, e o MAI apenas confunde porque dá jeito confundir, à semelhança da referência que fez no passado aos serviços remunerados, rotulando como “bónus” algo que destrói a saúde, equilíbrio e estabilidade dos polícias, para manter o seu equilíbrio financeiro.
Mais recentemente, o MAI divulgou na comunicação social, nova valorização das remunerações dos polícias, invocando o ‘acelerador’ dos índices remuneratórios como solução, contudo, este anúncio não foi apresentado, nem discutido pelos sindicatos da PSP e ficam aquém do necessário, em valor e em destinatários, pelos dados que possuímos.
Com isto, o MAI, pretende aplicar o mesmo que se encontra previsto para a administração pública, numa tentativa de bloquear aquilo que há muito foi solicitado pela ASPP/PSP, ou seja, alterações à tabela remuneratória desta “carreira especial”.!
Conclusão
A realidade é inegável, no entanto, para o MAI a realidade é outra, diferente da realidade das críticas dos autarcas, da crítica dos comandantes, dos polícias, dos sindicatos de polícia, das populações.
Se me permitem;
– O que não quero e não gosto?
Populismo, mero discurso político, anúncios, secundarização pelos alertas.
Abordagens que confundam a opinião pública.
O assumir de novas valências ou serviços, como por exemplo, o serviço do SEF, sem os necessários recursos, meios, efetivos e valorização profissional e remuneratória dos polícias.
Politicas redutoras, populistas, meramente conjunturais e “enganadoras”, tais como polícias nas Juntas de Freguesia, Esquadras Móveis, protocolo com a GNR sustentadas em demasiada imagem e marketing.
A solução dos problemas baseada no alojamento, nos serviços remunerados e nos apoios sociais ou camarários.
Desvalorização da ainda existente ‘carreira especial “.
– O que quero?
Conhecimento e assunção da realidade por parte da tutela.
Assunção e dignificação como carreira especial que a PSP ainda é, e que assim está definido em Lei.
Respeito pela negociação coletiva.
Valorização salarial e retificação de índices nas diversas carreiras.
Reestruturação dos suplementos remuneratórios.
Criação de condições de trabalho, que respeite os direitos por que tantos lutaram, como sendo folgas, férias, higiene, saúde e segurança no trabalho.
Respeito pelos polícias e pelo seu estatuto profissional (principalmente pré aposentação).
…..
O MAI tem uma imagem pública de simpatia e sensibilidade, aliás num contraste com o seu antecessor, contudo, não pode permitir que o taticismo e cinismo político sejam a marca da sua legislatura no MAI.
E será importante registar que, a máxima “com café e bolos, se enganam os tolos”, não será uma opção fácil na PSP, por parte do MAI, uma vez que a ASPP/PSP cá estará na informação, no esclarecimento e na luta, para que tal não aconteça.
E isto, pelos polícias, pela PSP, pela segurança e pelos cidadãos…»
Artigo de opinião de Paulo Santos, presidente da 𝐀𝐬𝐬𝐨𝐜𝐢𝐚çã𝐨 𝐒𝐢𝐧𝐝𝐢𝐜𝐚𝐥 𝐝𝐨𝐬 𝐏𝐫𝐨𝐟𝐢𝐬𝐬𝐢𝐨𝐧𝐚𝐢𝐬 𝐝𝐚 𝐏𝐨𝐥í𝐜𝐢𝐚 (𝐀𝐒𝐏𝐏/𝐏𝐒𝐏)