É do conhecimento público que o patrulheiro da PSP é aquele que mais sofre os impactos das debilidades da instituição Polícia de Segurança Pública, principalmente quando essas debilidades já se tornam estruturais e erradamente normais.

Se aos comandantes de esquadra já se percebe a dificuldade de gerir um efetivo curto, se aos escaladores já se percebe o desespero na tentativa de resolver “amigavelmente” os lugares por ocupar na escala de serviço, se a tudo isto já se percebe um prejuízo até nas populações – o patrulheiro é aquele que mais sente “na pele” essas ineficiências.

Patrulheiro e há cerca de 22 anos no serviço operacional, cheguei a vivenciar entradas nos turnos de serviço, em formatura com sete ou oito elementos, há muito que já não vejo sequer os cidadãos, a querer vir para a polícia…

É meu propósito apenas partilhar mais um ciclo de trabalho, para que se perceba (se é que alguém ainda não percebeu), a realidade que alguns insistem em branquear ou esconder.

Após um serviço remunerado de cinco (5) horas, o qual terminou (por escala) na mesma hora em que deveria estar a entrar ao serviço de esquadra (coisa nunca antes vista), deparo-me, uma vez mais, com apenas três (3) polícias a entrar ao serviço no turno (00h00/08h00), ficando obviamente um dos meus colegas “isolado” na esquadra no atendimento ao público, aquando à nossa saída no carro-patrulha às ocorrências policiais (colocada em causa a segurança dos polícias).

Registe-se a existência de uma diretiva que acautela a necessidade de dois (2) profissionais no interior ou contexto operacional, para sua efetiva segurança, diretiva essa que surgiu após episódios de agressão a agentes de autoridade no interior das instalações policiais.

À entrada ao serviço, existia pendente uma ocorrência anterior de furto, a qual deixou de ter resposta em tempo útil pela razão de escassez de efetivo, algo assumido pela Central-Rádio.
Informações estas que presumo estarem gravadas…

Aquando da resposta no meu turno a essa ocorrência, o cidadão já não se encontrava disponível (colocada em causa o serviço às populações).

Pude ouvir por aquela Central-Rádio, a solicitação de um reboque para remover um veículo que impedia o acesso de um outro, possivelmente à sua residência, sendo que, a resposta dada pelo serviço era negativa, pela razão de o reboque apenas ter um polícia de serviço e como tal, as orientações superiores serão para o acionamento apenas para reboque de viaturas furtadas, por razões de segurança… (colocada em causa a segurança dos polícias e colocado em causa o serviço prestado às populações).

Ainda no mesmo turno, uma chamada de ruído para o carro-patrulha, pela existência de uma festa na via pública, com cerca de trinta (30) indivíduos, numa zona sensível da cidade.

Por indicações da Central-Rádio, o carro-patrulha teria de se deslocar ao local para restituir o direito ao descanso dos reclamantes, contudo, seria necessária a colaboração e apoio da Equipa de Intervenção Rápida de serviço (EIR), para que a intervenção policial pudesse acautelar a segurança dos intervenientes.

Em resposta a essa solicitação da Central-Rádio, a EIR comunica encontrar-se num evento (festas) e que por determinação do comandante de policiamento (em serviço remunerado) não iria abandonar o evento.

O carro-patrulha face a essa limitação, recebe instruções para não se deslocar ao local do ruído, por insuficiência de meios que permitam uma intervenção em segurança (colocada em causa a segurança dos polícias e a prestação do serviço às populações).

Eis que terminam treze (13) horas de serviço contínuas, cinco (5) em serviço remunerado, oito (???? em serviço ordinário, maioritariamente em período noturno, e volvidas apenas cinco (5) horas de intervalo – a correr bem, talvez três de descanso – novo serviço remunerado (colocada em causa a saúde do polícia).

Já pelas 00h00 e novamente, entro ao serviço no carro-patrulha e deparo-me com apenas três elementos de serviço, um só na esquadra (colocada em causa a segurança do polícia).

Este turno foi meu e foi real…

Uma realidade doentia, estúpida em que se normaliza o que deveria ser a exceção.

Até quando?

Paulo Santos, patrulheiro e presidente da Associação Sindical dos Profissionais da Policia (ASPP/PSP)